sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Esquinas

A esquina representa a infinitude de uma cidade. Talvez por isso os condomínios fechados sejam tão monótonos, exatamente por serem finitos. A sensação do confinamento murado é o oposto da esquina.
Imagine um livro sem rompimentos, sem bagunça, sem desencontros. É essa a idéia de uma cidade sem esquinas. E enganam-se aqueles que pensam que este texto se refere a Brasília. Nada mais óbvio que dizê-la assim. Nada mais falso. Afirmar tal certeza provém do fato de não se compreender que esquinas vão além da forma do corte urbano.
Daria no mesmo dizer que Saramago não possui rompimentos por seus períodos longos de duas ou mais páginas. As longas retas que percorre o escritor português são densas, sinuosas e repletas de esquinas em suas palavras descansadas.
Para quem ainda não se convenceu, pense num shopping, que se formalmente possui suas quinas, estas não passam de enfadonhos - como é bom o som da palavra enfadonho - e entediantes espaços sem graça, previsíveis e soníferos; algo como ficar lendo manuais de videocassete em várias línguas.
A esquina está em Brasília, está em São Paulo, está em Ouro Preto. Na esquina chove, na esquina se tropeça, na esquina se topa com o desconhecido, ou se foge dele por medo, medo de dobrar a página.


Um comentário:

Carlos de Brito e Mello disse...

Tanto é verdade que as esquinas se tornaram adequadas aos despachos, aos acertos de contas, às declarações de amor eterno, à formação das quadrilhas. A esquina é lugar de dilema, de crise - ao mesmo tempo, de encontro. Ela nos obrigada à consciência de mais de um caminho e reúne a fixidez de um lugar com a mobilidade de um espaço.